domingo, 15 de março de 2009

Dolls (2002)


Dolls (2002 ) - Takeshi Kitano

O nome deste filme pode tanto ser baseado na inspiração para estas histórias, o Teatro de Bonecos japonês, chamado "Bunkaru", quanto no fato de todos os seus personagens serem marionetes em um grande jogo da vida sobre o amor.

São três histórias intercaladas mas que não têm influência uma sobre a outra, contudo o tema do amor/sofrimento é o grande ponto de ligação entre eles.

Em primeiro lugar temos o garoto que subitamente deixa sua namorada para ir se casar com a filha do dono da empresa. Seus pais conseguiram fazer sua cabeça e o pai da noiva dera um grande dote para a família. Contudo, a antiga namorada do garoto, ao fracassar numa tentativa de suicídio, fica com sequelas que a deixam com a idade mental de uma criança. Ela não se lembra mais de nada e não consegue falar. O garoto, ao saber disso, deixa a noiva no altar e foge de casa para poder ficar com a antiga namorada. Vemos então sequências de beleza magníficas pois os dois jovens não conseguem se comunicar e não têm mais para onde ir. Porém algo faz com que o garoto não queira desgrudar dela, algo que só vamos descobrir no final do filme.

A idade mental da garota faz com que ela seja muito inconsequente. Isso faz com que o garoto tenha que se amarrar à garota com uma corda. Mais do que a função instrumental desta corda a beleza dela está no fato de ser o representante perfeito daquilo que se passa no coração do garoto. Eles não podem se comunicar, todas as formas de carinho não são mais reconhecíveis para a gorata, portanto, a corda é o único símbolo de união entre os dois, e é uma união forte e voluntária por parte do garoto. As pessoas ao redor não entendem do que se trata dois maltrapilhos andando amarrados por aí, nem sem se comunicarem, porém a força da imagem é o que dá o nó na garganta de quem está assistindo.

Vale lembrar que a trilha sonora deste filme pertence a nada menos que Joe Hisaishi que, entre outros filmes, musicou todos os do Miyazaki (Chihiro, Totoro, Mononoke, etc).

Ainda se intercalando temos a história do chefe da máfia japonesa. Ele é um homem forte que há muitos anos, ao se sentir fraco e achar que não poderia dar uma vida dígna à sua namorada, partiu em busca de poder, dizendo que assim que conseguisse voltaria para ela. Ela, então responde que estará sempre alí para esperá-lo. Porém é ele que não volta, envergonhado de tê-la deixado por tanto tempo. Mesmo que a máfia o tenha feito um homem forte e duro ele aindavai até o local onde sua namorada disse que eperaria, e ela está lá. Porém ele sempre fica à distância e nunca fala com ela. Eles já estão muito velhos, já passaram da meia-idade. Porém ela sempre está lá, espera, e volta para casa. 

A beleza, aqui, está naquilo que não acontece. É angustiante perceber naquele velho sua falta de capacidade de ir até sua antiga namorada, se sentar no banco do parque e comer com ela o almoço, e, ao mesmo tempo, a frieza com que consegue ordenar a morte de um amigo traidor. E isso, neste filme, se torna belo. E só é belo quando fala sobre nós mesmos.

Por fim, temos a história da cantora pop que, ao sofrer um acidente, não permite que ninguém a veja. Seu maior fã, que nunca conseguira falar com ela, pois ele é muito normal frente aos fãs "produzidos" que ela tem ao redor, percebe que a única forma de se encontrar finalmente com ela é furando os próprios olhos para não poder vê-la, já que esse é o motivo da cantora não receber visitas.

Mais uma vez temos a beleza sobre aquilo que é a negação das coisas. Apenas quando a imagem da cantora lhe é proibida é que ele tem total acesso à ela. Eles passam uma tarde juntos e ela se mostra um belo ser humano para com ele. Seus sonhos foram completamente realizados pois, uma vez no plano platônico deste amor ele não pode viver com ela, a experiência é justamente pautada na distância que existe entre os dois.

Ele volta para casa ouvindo as músicas pop em seu mp3.

Finalizando, se este filme tivesse que ser contado em uma imagem, ela seria esta que postei aqui. Os dois namorados, amarrados mas que não podem se comunicar, nem o toque tem algum significado para a garota, andam à procura de alguma coisa que faça com que disperte novamente, na garota, a lembrança de quem ela é e, principalmente, que ELE é para ela. Eles não têm mais nada senão um ao outro e as roupas do corpo. O mundo ao seu redor é imenso, porém é belo. E eles vão continuar andando, juntos.

Absolutamente, um filme para se assistir no escuro, em tela gigante, deitado e com alguém muito querido. Ou muito sozinho.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Mad Max I, II e III

Não tenho realmente muita coisa para falar desses filmes em separado, porém, quando comparados esses filmes têm muito a dizer sobre o cinema e o imaginário pós-apocalíptico dessa época.

Em primeiro lugar Mad Max, o conceito, me chamou a atenção por justamente tratar da vida de pessoas em um cenário pós-apocalíptico em que o ser humano e o meio em que ele vive estão deteriorados e recentemente destruídos por guerras ou escasses de recursos. Quem conhece a série de games Fallout entende o que significa a tal "wasteland", ou seja, a terra devastada, sem recursos naturais e quase que sem humanidade no sentido das características que tornam uma pessoa humana.
Em Mad Max (1979) o mundo, mais especialmente a Austrália, está passando por uma crise política e econômica que faz com que se proliferem grupos fora-da-lei como os motoqueiros do filme. É interessante observar como são esses motoqueiros. Eles são retratados quase como animais, suas vidas se resumem a vagar com sua guangue atrás de comida e combustível. Isso é o básico da sobrevivência. Os valores éticos e morais também os fazem vingar a morte de um parceiro respeitado, porém não há justiça nesse ato, há apenas vingança, olho por olho, dente por dente. Achei muito interessante o fato de eles não se comunicarem muito, a não ser por barulhos e gestos bastante animalescos. Esses são os homens do futuro, os fortes que sobrevivem através da lei do mais forte, o que grita mais alto.
Do outro lado está a representação do poder do estado na figura dos patrulheiros, dos quais Max (Mel Gibson com 10 anos de idade) faz parte. Os patrulheiros usam os carros oficiais, possuem um uniforme e seguem seu protocolo: deter os motoqueiros fora da lei. Pode-se notar, logo de início, que os patrulheiros desse futuro também não são muito diferentes dos motoqueiros pois, com um pouco mais de sofisticação, sua vida também não passa de deter ferozmente os motoqueiros durante o dia e ter alguma diversão simples a noite. E eles não sabem fazer mais nada além disso.
Os patrulheiros estão subjulgados ao governo do local, representados pelo promotor público. Assim que o primeiro motoqueiro é preso em flagrante, ao lado de um carro destruído, completamente drogado e com uma mulher nua acorrentada por perto, ele é levado para a delegacia. Porém, após alguns minutos o promotor entra na delegacia e exige a soltura do motoqueiro que, a contragosto dos policiais, volta para as ruas imediatamente. Pode-se notar, portanto, que o futuro retratado é um completo caos pois não somente os fatores naturais estão contra os patrulheiros como o governo local libera os motoqueiros presos assim que seu chefe aparece na cidade.
Em termos "pós-apocalípticos" Mad Max (1979) é um grande filme pois, não bastasse tudo o que já citei, o fim do filme mostra toda a família dele ser destruída pelos motoqueiros, o que o torna "Mad". Infelizmente a mulher de Max se encontra com os motoqueiros por PURO acaso, o que diminui um pouco a força da história, porém, após esse encontro mulher e filha são brutalmente atropeladas, destruíndo o último pilar que mantinha Max com alguma humanidade. A partir de então ele se torna nada mais que um "motoqueiro num carro V8" pois ele sai à caça, literalmente, procurando vingança.

Em seguida temos Mad Max 2, na época com o nome original de "Road Wariors" (1981). O filme é uma excelente continuação da história de Max e também um imenso aumento na qualidade da imagem do filme. Em uma breve introdução que utiliza trechos de Mad Max 1 ficamos sabendo que o mundo entrou em colápso, conhecemos os tipos "motoqueiros" e o valor que o combustível passou a ter após tudo isso.
Max é um homem solitário, carrancudo, que anda em seu V8, utilizado nas vinganças contra os motoqueiros que mataram sua mulher. Contudo, tudo indica que ele está mais velho e muito mais experiente em matéria de viver sozinho vagando pelo mundo, que agora não parece mais uma cidade do interior da Austrália mas realmente um deserto.
Max realemente perdeu quase toda sua humanidade. Pode-se perceber isso no momento em que ele rende o homem do girocóptero e faz dele um tipo de escravo.
Assim que Max percebe, com seu instinto animal que tomou o lugar do humano, a presença de alguns motoqueiros e de um forte com um caminhão tanque, ele pára e monta acampamento para poder estudar a situação. Nesse momento o filme mostra que veio representar a terra arrasada do futuro destruído pois assim que alguns carros tentam fugir do forte para buscar reforços os motoqueiros interceptam um a um, matam os homens e se aproveitam das mulheres, que também são mortas em seguida. Tudo isso é visto através da luneta de Max, à distância, pois não é possível fazer nada para impedir e aquilo também não diz respeito a ele, e sim ao mundo em que vive.
Max ajuda um sobrevivente desse massacre fazendo um acordo de que ele o levaria de volta ao forte se o homem prometesse combustível. Trato feito o homem morre ao chegar no forte e o acordo morre com ele. Porém Max usa suas habilidades para ganhar a confiança do povo do forte e faz um novo trato de que faria com que saíssem de lá vivos e com o combustível em troca de todo o combustível que Max pudesse carregar.
A partir de então o filme mostra a tentativa despercebida de Max de restituir sua humanidade e ao mesmo tempo o mundo nada humano à sua volta. Quase todos os guerreiros do forte mais próximos de Max vão sendo mortos sem cerimonias nem lágrimas assim como os motoqueiros também vão. Por fim, Max acaba novamente sozinho, porém com as dívidas pagas.

Finalmente, Mad Max e a Cúpula do Trovão (1985). Após o sucesso de Mad Max e Mad Max 2, o personagem começou a mostrar que poderia fazer dinheiro em Hollywood, e aliás, não precisaria mais ser dublado por atores norte-americanos. Dessa forma, surgiu esse último filme da série, com Tina Turner no papel da "vilã".
É interessante notar que todo o aspecto desertico dos filmes anteriores foram substituídos por um cenário mais "Star Wars", com bichos fantásticos, anões, arte oriental e outras coisas mais. O mundo pós-apocalíptico foi substituído por um mundo fantástico, quase "há muito tempo atrás numa galáxia distante". Inclusive com a presença dos Ewok, representados pela tribo de crianças que esperam que o Capital-qualquer-coisa volte. É quase ridícula a cena em que a garota pega uma espécie de tela de televisão para contar a história dos povos antigos e da queda do avião do tal Capitão-sei-á-oque.
Ainda que os roteiristas, os mesmos que escreveram e dirigiram o I e o II, tenham tentado colocar um pouco de humanidade não só em Max mas em todos os habitantes desse mundo, fiquei com a impressão de que o que conseguiram fazer foi deixar todo mundo como uma criança que faz as coisas erradas porque apenas não param pra pensar direito e que, no fundo, todo mundo é meio que desculpado pela carinha inocente que faz.

Há rumores de que está em pré-produção um Mad Max 4. Espero que esqueçam que existiu Matrix e se prestem a fazer um filme mais denso ao invés de mais pirotécnico, como já haviam feito em Mad Max I e Mad Max II.